A história mostra-nos o mais largo horizonte da humanidade, oferece-nos os conteúdos tradicionais que fundamentam a nossa vida, indica-nos os critérios para avaliação do presente, liberta-nos da inconsciente ligação à nossa época e ensina-nos a ver o homem nas suas mais elevadas possibilidades e nas suas realizações imperceptíveis.(...)A experiência do presente compreende-se melhor reflectida no espelho da história. Karl Jaspers

sábado, 25 de abril de 2009

O CAFÉ NO RIO DE JANEIRO

Antes da revolução industrial o café era pouco mais que uma curiosidade na Europa. Na corte de Luiz XIV consumia-se a bebida como uma novidade exótica. A exemplo do chocolate ou do mate, ao café foram inicialmente atribuídas propriedades excepcionais. Um exemplo disto foi justificar-se o crescimento demográfico turco, que foi atribuído ao café, devido ao largo consumo da bebida pela população.
A partir do ano de 1715 há registro da existência de plantações no continente americano. No Brasil a introdução das primeiras mudas foi feita pelo Tenente Palheta que obteve as mudas na Guiana francesa e iniciou sua plantação no estado do Pará. Quanto ao Rio de Janeiro, os primeiros registros de plantações de café datam de 1760, quando o Bispo Castelo Branco trouxe algumas sementes, que foram plantadas inicialmente no pomar do convento dos barbudinhos, e também em São Cristovão, no Mendanha, em São Gonçalo e Resende.
O marquês do Lavradio foi o primeiro grande incentivador do plantio de café, concedendo inclusive, isenção de serviço militar aos plantadores no município de São João Marcos e D.João VI concedeu sesmarias para o cultivo de café.
De um início tímido, mais agora as plantações multiplicaram-se, e o café começa a ganhar importância no mercado mundial, para que se estabeleça um paralelo do crescimento da produção no Brasil, observa-se que em 1766 há registro de exportação de café no Rio de Janeiro de 8.500 toneladas, apenas 12 anos depois de 1808 são exportadas 82.200 toneladas pelo mesmo porto. A Percepção da importância do café já é clara em 1822 quando José Bonifácio elege-o, junto com o fumo, para figurar na bandeira do império brasileiro.
A produção cafeeira iniciou-se como uma produção familiar, simultânea a grandes plantações, agora começa a dar sinal de hipertrofia das grandes plantações, sugerindo que: economias de escala, barreiras de autoconfinamento e apropriação das melhores terras por grandes produtores, debilitaram a pequena produção cafeeira. A persistente queda do preço internacional, com um constante aumento da oferta, e um alargamento do mercado para a bebida, somadas a simultânea elevação do valor do escravo, principalmente a partir de 1850, fizeram da grande plantação a forma dominante da cafeicultura fluminense.
Sem exagero, o café como atividade econômica central nasceu no interior da cidade do Rio de Janeiro, foi também aí o lugar de seu primeiro recuo. A devastação das matas da Tijuca, inicialmente com os canaviais, e depois com a multiplicação cafeeira, afetou os mananciais da cidade, o que ocasionou um recuo na plantação e a necessidade de um urgente reflorestamento. Mesmo assim podemos dizer que o café se projetou na história brasileira a partir da Tijuca.
A marcha expansiva da cafeicultura injetou densidade demográfica na província fluminense. Antes do café, a produção de alimentos para a cidade, e a economia do açúcar na planície fluminense, eram os principais núcleos ativos no interior. Apenas o litoral era ocupado, pontilhado por modesta presença em Parati, Angra dos Reis e outros pequenos povoados.
Até a chegada do café na província fluminense, o grande destaque da produção era a cana de açúcar, para a produção do açúcar e da cachaça, com a chegada do café houve um salto com direção ao interior fluminense, portanto podemos até afirmar que o Rio como conhecemos é certamente uma criação do café. Não restaram vestígios de outras iniciativas de incentivo a ocupação, no período Joanino, houve tentativas de plantações de anil e chá, que redundaram em fracasso.
A formação de cafezal tem início com a operação de desmatamentos. As terras virgens e bem drenadas são as mais adequadas para o cultivo do café. No Rio de Janeiro a operação de derrubada e remoção dos troncos das matas virgens, é realizada geralmente em escarpas e declives. Na cafeicultura fluminense não houve plantio em curvas de nível nem qualquer preocupação com a conservação do solo, geralmente as fileiras de café se alinhavam de baixo para cima, o que facilitava a erosão. Entre as fileiras do café eram consorciados os plantios de milho e do feijão. Após o quinto ano o cafezal inicia sua produção que atingia carga total por volta do sétimo ano. Duas pragas sempre rondaram os cafezais; a erva de passarinho e a saúva. O cafezal depois de formado exige um mínimo de três capinas anuais além de outros cuidados, estas técnicas de plantio e manejo assim como de beneficiamento nos foram transmitidos provavelmente por produtores da Guiana francesa, de onde vieram nossas primeiras mudas.
No início da expansão cafeeira, as terras virgens fluminenses praticamente não tinham nenhum valor. Foram utilizadas para o plantio as antigas e imprecisas sesmarias distribuídas no recôncavo fluminense e ao longo do caminho novo para Juiz de fora. A partir de 1822 foi extinta a concessão de sesmarias e praticou-se o reconhecimento de posse. A plantação cafeeira utilizava alguma mão-de-obra livre, feitores, e artesões, porém a força do trabalho da plantação era essencialmente de escravos. A não utilização da mão-de-obra escrava, em operações de derrubada e limpeza de florestas devia-se a redução do risco de morte, fato que demonstra a preocupação com o valor do escravo. Em uma fazenda com cafezais plenamente produtivos a escravaria representava aproximadamente 40% do valor da propriedade. A compra de escravos, de ferramentas e bens necessários à manutenção da escravaria, representavam o investimento na plantação. Na economia escravista a fazenda plantada tinha baixa liquidez. O grande valor era o conjunto de escravos-etimologicamente, “a fazenda” a produtividade do cafezal depende do trato que recebe, e o trato é dado em função do preço. Depois de formado o cafezal não mais admite plantio nas entrefilas, o que aumenta a despesa com alimentação para a escravaria.
Entre 1835 e 1867, a produção cafeeira se multiplicou seis vezes, ao final deste período o Rio de Janeiro era responsável por 90% do café brasileiro, já em 1870 é patente o declínio da produtividade nas primeiras zonas plantadas com o café, porém, até a abolição o Rio de Janeiro manterá seu predomínio na produção.
Ao longo da primeira metade do século XIX, o café fluminense sustentou as exportações do império e ocupou com 60% a primazia da produção mundial. O porto exportador do café era o do Rio de Janeiro. Não é exagero afirmar que foi a ampliação da oferta do café fluminense que criou o mercado mundial do produto.
A primeira vista, o processo produtivo é singelo tecnicamente tanto para a formação da lavoura cafeeira quanto para a colheita e beneficiamento, no entanto sob um aspecto decisivo, o investimento em café é mais complexo que até mesmo o da cana-de-açúcar, a plantação de café exige prazo de financiamentos mais longos do que os requeridos pelo engenho ou pela indústria têxtil o motivo principal que dá causa a esta necessidade de longos prazos é o tempo entre o preparo da terra, o plantio e a colheita.
A fronteira de terras apropriadas para o café foi progressivamente movendo-se de acordo com a expansão da ferrovia, e modificou a forma da contratação do colono ligado ao café, principalmente em São Paulo, passou-se a utilizar os imigrantes contratados para formar a plantação, recebiam um pagamento por pé de café, e a partir deste ponto utilizava-se a mão de obra escrava. No Rio de Janeiro prevaleceu a grande plantação utilizando mão de obra exclusivamente escrava em quase todas as etapas.
Como agente financiador de crédito ao produtor não havia durante o primeiro império nenhum órgão oficial, este financiamento ficou por conta das “casas comissárias”, que se encarregavam pelo crédito para compra de escravos, ferramentas e alimentos, fornecidos até o início da produção, e em contrapartida esta obtinha exclusividade na compra da produção. Estas casas mantinham ligações com bancos no exterior para suas operações cambiais. Grande parte do dinheiro empregado nos financiamentos, veio, sem dúvida do comércio negreiro que tinha no Rio de Janeiro seu principal ponto. O grande sistema mercantil do tráfico negreiro articulou-se com a implantação cafeeira, como já o fazia com a produção açucareira e de aguardente. O ouro vindo das Minas Gerias, serviu de portfólio do capital mercantil colonial, como reserva de valor e garantia de liquidez internacional. E apesar da vinda de bancos estrangeiros, principalmente ingleses, para o Brasil, o comando do negócio cafeeiro que nasceu solidamente fundado em interesses internos, permaneceu sob o comando do capital nacional. O dinamismo do sistema de financiamento dependia da constante oferta da mão-de-obra escrava, este era um ponto crítico, que iniciou ter problemas quando em 1831, pressionado pela Inglaterra, o Brasil formalmente aceitou a proibição do tráfico, tendo este continuado clandestinamente. Mais relutante ainda o império proíbe em 1850 o tráfico vindo da África, o Rio passa a importar escravos de outras partes do Brasil, no entanto outros fatos se sucederam, a guerra do Paraguai produziu uma relativa baixa na mão-de-obra, com o adendo da alforria para a prestação do serviço militar, e mesmo no pós guerra a grande maioria destes não voltou as lavouras.
O fim do tráfico valorizou os escravos encarecendo sua aquisição e isto acelerou a decadência das velhas lavouras já com reduzida produtividade, caiu o valor residual das terras envelhecidas e estes cafezais antigos foram abandonados. Baixo preço do café, baixo trato do cafezal, escravos desviados para a produção de alimentos, visando atender as demandas surgidas nas áreas de cafezais já produtivos foram fatores que contribuíram para o inicio da decadência do ciclo do café. Além disso, a partir de 1820, surgiu uma praga conhecida como mal de Cantagalo, a necessidade da venda de escravos, as velhas plantações, já improdutivas ou declinantes, outros fatores que também contribuíram: reduzir o número de capinas, a poda e o decote, operações que prolongavam a vida útil do cafezal.
Havia uma imensa rede de estradas carroçáveis que drenavam a produção de café para uma série de pequenos portos, e destes, o café era trazido ao porto do Rio, para então partir rumo ao mundo. Imensa foi à rede de estradas e caminhos abertos em função da expansão do café no Rio de Janeiro, e mesmo em estados vizinhos, o café criou uma rede de pequenas cidades locais, cuja razão da existência é inteiramente externa à sua vida urbana. Destas cidades a que merece maior destaque é Vassouras, onde era flagrante o contraste de luxo das sedes das fazendas cafeeiras com a modéstia relativa das residências de fazendeiros nas cidades locais.
O café fluminense gerou lugares sem dinamismo, cidades locais débeis que se esvaziaram com o declínio da cafeicultura, como exemplo às “cidades mortas” do Vale do Paraíba. Sobreviveram poucas cidades locais que serviam de segunda residência para os ricos da metrópole, são exemplos; Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo e Cabo frio.
Em 1880 é ainda prospera a cafeicultura na província do Rio de Janeiro, mas sua rentabilidade é declinante. Nesta época o café está sendo rapidamente erradicado do Vale do Paraíba e, em compensação, incorpora-se ao norte fluminense à produção tem neste período a diferenciação do café bebida: o tipo do café do Rio é menos valioso que o tipo de café de Santos, as terras do oeste paulista são superiores as de Itaperuna, produzem um café com bebida e tamanho mais valorizados no mercado internacional. Entre 1870 e 1900 inicia-se a decadência da cafeicultura fluminense, neste período a um longo descenso cíclico do café a nível mundial, e a produção fluminense, chega a reduzir-se a metade. Ao longo do Séc. XX a história do café fluminense é a crônica de uma longa morte anunciada. Ainda um pequeno fôlego durante as décadas de 1950 e 1960 com a descoberta de que o café Rio é o mais indicado para a produção do café solúvel.
O café está ligado à preservação da unidade nacional. As tendências separatistas ou foram superadas pela mão militar, a partir do Rio de Janeiro, ou por negociação. Prevalecendo sempre como força conciliadora o temor oligárquico de revoltar populares que ameaçassem seu patrimônio. Mesmo com o declínio da cafeicultura a maioria dos grandes plantadores de café conseguiu contornar a crise, ora investindo até mesmo em café no interior de São Paulo ou com negócios comerciais e financeiros no próprio Rio de Janeiro.
Certo é que até mesmo por razões topográficas e de qualidade do solo, a agricultura do estado do Rio de Janeiro, após o ciclo cafeeiro jamais foi uma atividade substancial e dinâmica.

Celso de Almeida.
*Foto: Plantação de café.

4 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns e obrigada!o seu blog me ajudou e me ensinou bastante.Continue assim!!!bjs

Anônimo disse...

Muito bom mesmo, bem informativo. Parabéns!

Anônimo disse...

ótima postagem! Parabéns.

Anônimo disse...

parabens boa historia




























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